quarta-feira, 3 de julho de 2013

ALCOOLISMO, SEU IMPACTO NA FAMÍLIA E O SERVIÇO SOCIAL



ALCOOLISMO, SEU IMPACTO NA FAMÍLIA E O SERVIÇO SOCIAL


RESUMO

O presente trabalho trata-se da questão do alcoolismo e seu impacto nas diversas esferas da sociedade. A justificativa pela escolha do tema se dá devido à importância que o consumo do álcool assumiu ao longo dos tempos em diversas esferas da vida social. Este estudo faz de maneira breve uma trajetória conceitual e histórica do que é o alcoolismo e o alcoólatra, e aborda o consumo do álcool ao longo da história da humanidade. O trabalho analisa a vulnerabilidades da família, cujo chefe é alcoólatra. Assim busca problematizar as relações familiares deste dependente, trazendo para debate o papel do assistente social neste contexto, que deve buscar o fortalecimento da família e o apoio aos indivíduos que se encontram em vulnerabilidade. Porém, verifica-se que há muitos desafios a serem vencido, um deles está na própria sociedade que valoriza o consumo de bebidas alcoólicas, elevando este a um conceito de “status”.

Palavras - chave: Álcool. Consumo. Dependência. Família. Desafios.


RESUMEN

En este trabajo se aborda el tema del alcoholismo y su impacto en los diferentes ámbitos de la sociedad. La justificación de la elección del tema se debe a la importancia que el consumo de alcohol ha tomado en los últimos años en diversos ámbitos de la vida social. Este estudio es una breve trayectoria conceptual e histórica de lo que es el alcoholismo y el alcohólico, y se analiza el consumo de alcohol a lo largo de la historia de la humanidad. El trabajo analiza la vulnerabilidad de la familia, cuyo jefe es un alcohólico. Simplemente busca problematizar estas relaciones familiares dependientes, con lo que para debatir el papel del trabajador social en este contexto, se debe buscar el fortalecimiento de la familia y el apoyo a las personas que se encuentran en vulnerabilidad. Sin embargo, resulta que hay muchos desafíos por superar, una es la misma sociedad que valora el consumo de bebidas alcohólicas, con lo que a un concepto de "status".

Palabras clave: Alcohol. Consumo. La dependencia. Familia. Desafíos.

INTRODUÇÃO

Desde o início dos tempos, nas sociedades, o homem tentou mudar o humor, as percepções e as sensações, através do uso de substâncias psicoativas[1]. Essas substâncias eram extraídas da natureza e utilizadas em ocasiões diversas.
Com a industrialização o uso de substâncias extraídas da natureza foi ampliado e com isso o aumento exagerado de consumo pelo homem. Nesse contexto, o uso de substâncias psicoativas assumiu novas funções, sendo preferido pelo indivíduo com algo que gera prazer, alívio de desconfortos físicos e de sofrimentos de caráter emocional. Entre essas substâncias configura-se o álcool, presente em uma infinidade de bebidas alcoólicas.
A bebida alcoólica é considerada por muitos estudiosos sobre o assunto como a bebida mais consumida pela humanidade desde seus primórdios. Seu uso está associado aos aspectos culturais em sociedade, sendo consumida, em situações e ocasiões diversas como: rituais religiosos, comemorações datas festivas de aniversários, casamentos, natal, ano novo, confraternizações de empresas, hap hours, entre outros.
De acordo com Bucher (1992), o álcool tem sido apontado como a droga mais consumida, ou pelo menos, experimentada no Brasil e o problema do consumo de bebidas alcoólicas encontra-se presente na sociedade, independente de classe social. Nesse contexto, Laranjeira e Pinsky (2001) alertam que consumo dessas bebidas alcoólicas ocorre de forma precoce no indivíduo, ou seja, ainda na adolescência, com grupos de amigos e até mesmo dentro de casa, inerente aos olhos da família. Esse tipo de prática pode levar ao consumo abusivo, com isso potencializando o problema do alcoolismo.
Quando o indivíduo torna-se dependente do álcool, a bebida pode gerar grande impacto social tanto na vida do alcoolista quanto de sua família. E nesse aspecto Kaloustian (2004) destaca que a família torna-se o meio principal do processo de recuperação de seus membros, sendo a família quem vai garantir a sobrevivência, desenvolvimento e proteção desses, independentemente dos arranjos em que essa família se encontra.
Cabe à família a incumbência de recuperação de seu membro alcoólico e muitas das, por falta de estrutura, essa luta se torna muito difícil. Portanto, essas famílias precisam contar com ações de políticas de assistência social existentes, que objetivam justamente a proteção e fortalecimento dessa estrutura familiar.

Metodologia

Portanto, o propósito da realização deste estudo, em linhas gerais, consiste em compreender melhor sobre o problema do alcoolismo e o seu impacto direto na estrutura familiar, vulnerabilizando a referida família. Cabe ainda refletir sobre as políticas sociais existentes na retomada de ações de fortalecimento dessas famílias.
O delineamento de estudo consiste em buscar literaturas sobre o assunto, através de material de pesquisa em: livros disponibilizados pela biblioteca da Instituição – UEMG/FUNEDI/ISED; artigos publicados; consultas pela Internet e uso de jornais e revistas.
Para a organização e desenvolvimento deste estudo, pretendeu apresentá-lo, iniciando com esta introdução que cumprirá o papel de nortear toda a dinâmica que subsidia a pesquisa em estudo.

As Definições de Alcoolismo e Alcoólatra

Segundo a Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas (BRASIL, 2010), o alcoolismo é uma situação de causa biológica primária e com história natural previsível.  De acordo com a Instituição Alcoólicos Anônimos (2005), o alcoolismo é caracterizado pela destruição do controle do indivíduo, prejudicando seu modo de viver.
Nos anos de 1950, foi incluído na literatura acadêmica que o alcoolismo é considerado um vicio, sendo que esse conceito estava fundamentado nas concepções médicas e leigas do século XIX de embriaguez como um vício. Em 1977, um Grupo de Pesquisadores da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2007), reagindo ao uso amplo e diversificado da palavra alcoolismo, sugeriu substituí-lo pelo termo psiquiátrico “síndrome de dependência do álcool”. Devido à analogia com a dependência de drogas, a dependência de álcool tem encontrado aprovação geral nas atuais nosologias (BRASIL, 2010). Vários teóricos definem o alcoolismo como doença. Segundo Hoff (1996, p. 212) o alcoolismo pertence à categoria das enfermidades psiquiátricas, mas é mais comum e devastadora que estas. “Alcoolismo crônico está física e psicologicamente ligado à droga chamada álcool”.
            Por este conceito, pode-se entender que o alcoolismo é considerado uma doença psiquiátrica, porém mais destruidora que as demais doenças classificadas neste ramo da medicina, pois diante de sua abstinência o alcoólatra tem tremores, alucinações e medo irracional. Portanto o alcoólatra sente a necessidade de beber para evitar tais sintomas.
Conforme Souza (2002, p. 8), “o alcoolismo é uma doença, que já está comprovado cientificamente” [...] “porque o organismo do alcoólatra manifesta de forma alterada diante do álcool.” Kathleen Ross (2002, p. 10) coloca que “o alcoolismo é uma doença progressiva que se torna cada vez menos dentro dos padrões de quem bebe socialmente e cada vez mais uma obsessão particular”. Segundo a autora, está doença pode ser controlada, mas, porém são controlados por ela, e por fim tentam controlar todos que estão a sua volta. Pois finalmente, é uma doença de negação, na qual os bebedores se recusam em admitir que a bebida esteja destruindo as suas vidas. Infelizmente o álcool vai tomando espaço e gerando seqüelas para o alcoólatra, trazendo vários problemas para sua família e os que estão em sua volta. 
Todos os autores citados definem o alcoolismo como uma doença e explicitam de forma visível as conseqüências que a mesma gera sob o aspecto físico e psíquico seu usuário, bem como para seus familiares. Todavia, definir o alcoólatra não é fácil, pois quem bebe demasiadamente algumas vezes ou nos fins de semana pode não ser considerado um alcoólatra, quando este ainda é capaz de escolher a hora, o lugar ou a ocasião em que beberá. 
O alcoólatra para Hoff  (1996, p. 212) “é aquele que não pode deixar de beber todos os dias, ou que quando começa a beber, é incapaz de parar.” Conforme aponta o autor, o mesmo não sabe os seus próprios limites, o quanto pode beber, ou quando deve parar de ingerir bebida alcoólica. Sendo assim o vicio torna-se a atividade mais importante para o alcoólatra, impedindo o mesmo a freqüentar lugares ou ocasiões na qual a bebida não será servida. 
A medicina considera o alcoolismo uma doença progressiva que sempre provoca morte prematura. Esta enfermidade é muito complexa, pois afeta não somente a sua mente, mas todo o seu organismo, quer dizer, toda a sua consciência. Quando o indivíduo se torna alcoólatra ele se sente incapaz de abandonar o vício; e se o alcoólatra não receber ajuda será quase impossível deixar de ingerir álcool.
Considera-se que o alcoolismo, que vem a ser um grande problema social, é visto como uma toxicomania pela Organização Mundial da Saúde (OMS, 1970), que a conceitua como:

Um estado psíquico e algumas vezes também físico. Resultante da interação entre um organismo vivo e uma substância, caracterizado por um comportamento e outras reações que incluem sempre compulsão para ingerir a droga, de forma contínua ou periódica, com a finalidade de experimentar seus efeitos psíquicos e às vezes para evitar o desconforto de sua abstinência. A tolerância pode existir ou faltar e o indivíduo pode ser dependente de mais de uma droga. (OMS, 1970, p.7)

Essa conceituação refere-se à toxicomania ou fármaco-dependência. Nesse caso o alcoolismo tem caráter ou sinais distintos, pois se verifica que o alcoólatra tende a aumentar as doses ingeridas gradativamente e quando interrompe completa ou bruscamente a ingestão de álcool, apresenta o grave conjunto de sinais e sintomas físico-psíquicos que caracterizam a Síndrome de Abstinência Alcoólica (ressaca). A Organização Mundial da Saúde (OMS) apresentou as seguintes definições de alcoolismo e de alcoólatra:

Alcoolismo é uma doença de natureza complexa, na qual o álcool atua como fator determinante sobre causas psicossomáticas preexistentes no indivíduo e para cujo tratamento é preciso recorrer a processos profiláticos e terapêuticos de grande amplitude.
(...) Alcoólatras são bebedores excessivos, cuja dependência do álcool chega a ponto de acarretar-lhes perturbações mentais evidentes, manifestações que afetam a saúde física e mental, suas reações individuais, seu comportamento sócio-econômico ou pró-domos de perturbações desse gênero e que, por isso, necessitam de tratamento. (OMS, 1970, p.2)

Ocorreram algumas alterações nesse conceito na atualidade, passando-se a chamar os usuários "bebedores - problema" e os dependentes de álcool "alcoolistas" (BRASIL, 1990). É importante destacar que a palavra alcoolismo foi usada pela primeira vez em 1856 pelo médico sueco Magnus-Huss, para determinar os sinais e sintomas físico-psíquicos oriundos da excessiva ingestão de doses e por tempo prolongado (FORTES, 1975).
Segundo Jellinek (apud FORTES, 1975), um dos mais brilhantes pesquisadores do "Yale Center of Alcohol Studies", o alcoolismo é qualquer uso de bebidas alcoólicas que ocasiona prejuízos ao indivíduo, à sociedade ou a ambos. Masur (1984) tem a certeza de que o alcoolismo é uma doença, na medida em que envolve um estado de dependência tão grande que leva a um prejuízo físico e/ou interpessoal e estabelece a sua existência à perda da liberdade sobre o ato de beber.
Há controvérsias, em relação às causas do alcoolismo. Alguns autores aceitam os sintomas da intoxicação crônica pelo álcool como sendo roupagens que escondem ou disfarçam uma personalidade mórbida. Não haveria propriamente alcoolismo primário, sendo os casos relatados como alcoolismo secundários a "algo" subjacente à personalidade do paciente. Em outras palavras, o indivíduo normal nunca se tornaria um alcoolista crônico. Sempre haveria necessidade da existência de um fator ligado a uma personalidade mórbida (FORTES, 1975).
            Pacheco e Amaral (apud FORTES, 1975), analisando internações motivadas por alcoolismo, assinalaram o importante contingente representado pelo alcoolismo secundário. Contrário a esse ponto de vista, Mayer-Gross (1958) apud Fortes (1975) relata que nem todos os alcoólatras teriam personalidade fortemente predisposta e argumenta que a massa de alcoolistas não provém unicamente deste ou daquele grupo em particular, constituindo sempre um grupo muito heterogêneo.
Já Sonnenreich (1971, apud Fortes (1975) defende que o alcoolismo é uma doença adquirida à revelia de quaisquer predisposições psicossomáticas preexistentes: é decorrente do uso contínuo do próprio álcool. Masur (1984) aponta que não ha uma resposta breve, clara e convincente; existem várias tentativas de respostas, como a vulnerabilidade biológica, a psicológica e a social. Isto partindo da premissa de que todos que bebem têm potencialmente a possibilidade de se tornar alcoolistas. A maior ou menor probabilidade vai depender da interação entre os diferentes fatores da vulnerabilidade.
Sendo assim, parece não haver uma causa única ou isolada, pois o ato de beber pode resultar de uma variedade de inter-relações de influências. Cada pessoa repercute de forma diferente com a ingestão de álcool (CERVESATO, 1993).

O Alcoolismo ao Longo da História

Segundo Mechetti (2003) relata que foi na Pré-História que teve início a bebida alcoólica precisamente durante o período Neolítico, na época da invenção da cerâmica e o surgimento da agricultura.
Há 10.000 anos o ser humano passou a ingerir e a atribuir diferentes significados ao uso do álcool no qual tinha um processo de fermentação natural. Na época os povos celtas, gregos, romanos, egípcios e babilônios registraram de alguma forma o consumo e a produção de bebidas alcoólicas (MECHETTI, 2003). A própria Bíblia no livro de Gênesis (9-21) aponta que Noé, após o dilúvio plantou vinha, fazendo o vinho, bebendo a ponto de se embriagar, tendo se despido e desmaiado (BIBLIA SAGRADA, 1985).

Grécia e Roma

Segundo Mechetti, (2003), os gregos e romanos por outro lado conheciam a fermentação do mel e da cevada, mas o vinho era a bebida mais divulgada nos dois impérios, possuindo grande valia religiosa, medicamentosa e social. Pois o solo e o clima na Grécia e Roma serem específicos e ricos para o cultivo da uva e produção do vinho.
Mechetti (2003) relata que embora o vinho participe ativamente das celebrações sociais e religiosas greco-romanas, e que os abusos de álcool já eram severamente censurados pelos dois povos. O dramaturgo grego Eurípedes (484 a.C. - 406 a.C.) no período da Grécia Antiga relata nas Bacantes duas divindades de primeira grandeza para os humanos: Deméter, a deusa da agricultura criava os alimentos sólidos para alimentar os humanos, e Dionísio, o Deus do vinho e da festa (Baco para os Romanos). Observa-se que nesta época havia povos que não aceitavam os abusos do álcool (MECHETTI, 2003).

Idade Média
           
Durante este período à comercialização do vinho e a cerveja cresceu demasiadamente, assim como sua regulamentação. Pois a intoxicação alcoólica (bebedeira) deixa de ser reprovada pela igreja e passa a ser um pecado ponderado por esta instituição (MECHETTI, C. 2003).
A modernidade instaurou a liberdade e autonomia para os indivíduos, fazendo com que a Igreja ocidental perdesse parte significativa do controle das pessoas. Para Mechetti (2003), os cabarés e as tabernas tornaram-se locais onde os indivíduos podiam divulgar se livremente e onde o uso de álcool participava dos debates políticos que mais tarde vão provocar a Revolução Francesa.
O fim do século XVIII e o início da Revolução Industrial são acompanhados de alteração demográficas e de condutas sociais na Europa, com significativo aumento populacional. A partir desta fase que o uso exagerado de bebida passa a ser aceito por alguns como uma doença ou motim (JEROME, 1993).
Segundo Martins (1982, apud. JEROME, 1993) a Revolução Industrial provocou a emigração de milhares de operários rurais que foram esquecidos nas cidades que não possuíam qualquer suporte. Quando conseguiam serviços eram subordinados às longas jornadas de trabalho cuja duração era altamente maléfico. Nesses períodos vários operários adoeciam de cólera, tuberculose e alcoolismo no qual eram bastante comuns (MARTINS, 1982 apud. JEROME, 1993). Assim lançados no mundo urbano e distantes de seus vínculos sociais rurais, submetidos às precárias jornadas de trabalho, os trabalhadores passaram a apresentar dentre outros males, o alcoolismo.
Com a elevação do consumo de álcool, a partir do século XX, países como a França passaram estabelecer limites para o seu consumo, estabelecendo a idade mínima de 18 anos para sua ingestão. A partir de 1920 os Estados Unidos da América decretaram a chamada Lei Seca que teve duração de quase 12 anos. A Lei Seca proibia a fabricação, transporte, venda troca, importação, exportação, distribuição, posse e consumo de bebida alcoólica. Para a economia americana e para a saúde pública foi considerada um desastre (TTB.GOV, 2012).
Em 1952 o alcoolismo passou a ser tratado como doença (JEROME, 1993). No ano de 1967 a Organização Mundial de Saúde estabeleceu a Classificação Internacional das Doenças 1967, tendo o alcoolismo o CID-8, incluindo assim o alcoolismo no rol de doenças (GEORGE, 1983, p.2). De acordo com CID-8, os problemas relacionados ao uso de álcool foram introduzidos dentro de uma classe mais ampla desordem de personalidade e de neuroses (NIAAA, 1995).
Esses problemas foram divididos em três classes: dependência, episódios de beber excessivo (abuso) e beber excessivo habitual.
A dependência em termos gerais, o estado de necessidade ou subordinação de alguma coisa ou alguém para apoio, funcionamento ou sobrevivência. Quando sobreposto ao álcool e outras drogas, o termo implica a necessidade de repetidas doses da droga para sentir-se bem ou para evitar sensações ruins. Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - Classificação Estatística Internacional de Doença e Problema Relacionado à Saúde (USP, 2000), a dependência é:

                                      Um conjunto de sintomas cognitivos, comportamentais, psicológicos              indicando que indivíduo tem o controle do uso da substância psicoativo     causando dano e persiste nesse uso a despeito de conseqüências oposta.

            O excesso algumas vezes utilizado de modo desaprovativo para determinar qualquer tipo de uso, particularmente o de drogas ilícitas. Devido à sua ambigüidade, o termo não é usado na 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10) da seguinte forma:

-          Beber intenso: definido em termos de ultrapassar certo volume diário (por exemplo, 3 doses diárias) ou determinadas quantidades (exemplo, 5 doses por ocasião, pelo menos uma vez por semana).
-          Beber moderado: significa beber quantidades moderadas e que não causam problemas.
-          Beber para esquecer: é determinado por um desejo ou necessidade de livrar de uma condição ou estado de humor desagradável. São vários motivos como uso de álcool por motivos pessoais ou oposição a motivos sociais, para suportar a situação ou beber para “afogar as mágoas”.  

A concepção de dependência ultrapassa o padrão moral, considerando que beber excessivamente caracteriza-se como falta de caráter e até mesmo o padrão de doença “alcoolismo”. Observou-se neste capítulo que a ingestão de álcool acompanha a humanidade desde os tempos antigos e no capítulo seguinte serão feitas análises sobre a economia do álcool e o impacto do álcool na saúde, no trabalho, no trânsito e na família.

As Vulnerabilidades da Família no Contexto do Alcoolismo

O consumo de álcool parece ser o hábito social mais antigo e disseminado entre as populações, pois ele está associado a ritos religiosos e lhe é atribuída uma variedade de efeitos, tais como calmante, afrodisíaco, estimulante do apetite, desinibidor e outros. Seu uso vem desde a pré-história. Porém, somente neste século, foram realizados estudos mais sistematizados, voltando-se para os problemas que o consumo de álcool vem ocasionando às populações (CARDIN et al, 1986).
O álcool pode ser proveniente de plantas de fácil cultivo como cevada, uvas, grãos de cereais e outros, que passarão por processos de fermentação e destilação, tornando-se a droga psicoativa mais consumida de todos os tempos. Por exemplo, o vinho ou similar, que desde a antigüidade é indispensável a comemorações, em momentos de alegria, ou como companheiro das desilusões (MASUR, 1984).
Sendo assim os problemas relacionados ao consumo de álcool normalmente exercem profundo efeito sobre a família do alcoólatra. De modo que se cria uma espécie de ressonância comportamental. O alcoólatra se torna gradativamente o centro das preocupações familiares. Para Ross (2002, p 13) “na medida em que os membros da família tentam, em vão, implicar, enganar ou forçar a parar de beber. As esposas se tornam obsessivas em conferir o conteúdo de cada uma das garrafas do armário de bebidas”.

As conseqüências para os filhos são significativas: “Se os pais forem alcoólatras ou beberem uns tragos a mais e aí forem educar seus filhos, não tenham dúvidas que os excessos praticados também deixarão marcas de revoltas nos filhos” (COLLINS, 1992, p. 312).  Os filhos serão muito mais afetados pela convivência com pais alcoólatras, eles experimentarão negação, culpa pressões para não aborrecer seus pais, que procurará qualquer desculpa para ingerir álcool.
Se por outro lado os pais não derem carinho, amor e atenção para os filhos, ou forem violentos, os filhos também podem começar a consumir álcool.

A permissividade e rejeição por parte dos pais estimulam o uso e abuso de tóxicos.    Quando os pais não se importam se os filhos bebem ou não, não existe preocupação quando aos perigos das drogas ou álcool e o abuso logo se segue. Se os pais negligenciam os filhos ou os castigam demasiadamente, estes se rebelam. “A delinqüência, uso excessivo de tóxicos e alcoolismo são comuns nesses casos”.  (COLLINS, 1992, p.315).

O alcoolismo reivindica mais vítimas. A auto-imagem e a imagem da família se tornam deturpadas devido ao comportamento tanto do dependente, quanto do co-dependente.  Vendo esta realidade os filhos dizem “isso nunca acontecerá comigo”, ou que não irá se casar com um alcoólatra. Mas segundo Black “Entre cinqüenta e sessenta por cento dos alcoólatras tiveram pai ou mãe alcoólatra, e um número surpreendente de filhos de alcoólatras casam-se com alcoólatras”.  (BLACK, apud ROSS, 2002, p. 19). 
O ambiente na casa de uma família alcoólica e a forma como os membros da família interatuam podem contribuir para o risco de problemas observados em filhos de alcoólicos. Apesar de as famílias alcoólicas serem um grupo heterogêneo, as características comuns do grupo foram identificadas. As famílias de alcoólicos têm baixos níveis de coesão familiar, expressividade, independência, e orientação intelectual e níveis elevados de conflito comparado com famílias não alcoólicas. Algumas características, contudo, não são específicas de famílias alcoólicas: a fraca capacidade de resolver problemas e a comunicação hostil é observada tanto em famílias alcoólicas como em famílias com outros problemas sem ser o álcool. Além disso, as características das famílias com membros em recuperação alcoólica e das famílias com membros não alcoólicos não diferem significativamente, sugerindo que a continuação do consumo de álcool pelos pais pode ser responsável pela separação da vida familiar num lar alcoólico.
O ambiente familiar também pode afetar a transmissão do alcoolismo aos filhos de alcoólicos. As crianças de pais alcoólicos têm menos probabilidades de se tornarem alcoólicos em adultos quando os seus pais constantemente determinaram e seguiram os planos e mantiveram estipuladas as férias e a regularidade das horas das refeições.
Sendo assim alcoolismo é uma doença da família, isso não significa que os cônjuges e os filhos gerem a doença, qualquer um, mais do que os membros da família, pode ser culpado por causar doenças físicas. O que significa que a família de um alcoólatra é mais vítima e torna os componentes da mesma, pouco saudáveis e parte de uma família de função defeituosa ou doente.  Certamente, vários alcoólatras tentam culpar as pessoas da família pelo próprio alcoolismo. Infelizmente as marcas de viver com um alcoólatra ficam mesmo depois de divorciar-se ou do filho sair de casa. As seqüelas deixadas na auto-imagem e para paz da mente cicatrizam lentamente. Isso se for tratada com assistência de terapeutas ou especialistas.
Além disso, logo que o indivíduo começa a ser alcoólatra a família torna-se viciada nos papéis que eles desempenham na família. Tornando-se desta maneira co-dependentes e ou co-alcoólatras dando seqüência às reações não saudáveis, das quais não conseguem libertar-se.
Segundo Bertolote no Glossário de Álcool e Drogas (BRASIL, 2010) a co-dependente é um parente, amigo próximo ou colega de uma pessoa alcoolista ou dependente de droga cujas reações são definidas por este termo como tendendo a perpetuar a dependência daquela pessoa e daí retardarem o processo de recuperação. No início dos anos 1970, os termos co-alcoolista e co-alcoolismo passaram a ser usados entre os que se tratavam de alcoolismo nos EUA, para caracterizar parentes próximos de alcoolistas (inicialmente a esposa, em especial). Com a mudança na terminologia de alcoolismo para dependência de álcool, os temos co-dependente direto e co-dependência passou a ser usados também para se referir aos parentes dos dependentes de outras drogas. O uso do termo implica uma necessidade de tratamento ou ajuda, e há quem proponha classificar a co-dependência como um transtorno psiquiátrico. O termo é também usado atualmente no sentido figurado para se referir à comunidade ou sociedade que age como um facilitador da dependência de álcool ou droga.
Portanto é necessário focar a análise não só no alcoólatra, mas em todos os envolvidos.

O Papel do Assistente Social no Tratamento do Alcoolismo

O Serviço Social é caracterizado como a profissão de intervenção na realidade humana e social. O Assistente social é o profissional que tem em mente o bem-estar coletivo e a integração do indivíduo na sociedade.
O atendimento ao dependente pode ser realizado em grupo e para que compartilhem seus problemas, medos e angústias. Ao mesmo tempo, amplia seus conhecimentos sobre o alcoolismo, criando-se um espaço terapêutico que possibilite a reflexão, o que provavelmente possibilitará a modificação de alguns comportamentos (FELIX, 2009).
O assistente social nos aspectos que dizem ao alcoolismo pode trabalhar como um orientador em questões de cunho sociabilizado e de caráter que se integra este indivíduo a sociedade. O profissional de serviço social atuará em diferentes campos onde haja a necessidade do mesmo. No âmbito familiar é eficaz a presença do assistente social para orientar os demais participantes dessa comunidade a entenderem o problema, aproximando-os do dependente, que muita das vezes é rejeitada pela própria família, e também não conhece os tratamentos existentes para o problema do alcoolismo. Cabe, então, ao assistente social a orientação e o encaminhamento do dependente, mas relacionando o tratamento com o apoio familiar, que é tão importante (CASTRO, 2009).
O papel do assistente social não se remete apenas ao caráter familiar. Algumas empresas contratam assistentes sociais para estabelecer um serviço de assistência social de orientação aos funcionários que possuam envolvimento com álcool. Esse trabalho, direcionado ao público que acaba por prejudicar seu desenvolvimento nas atividades dentro da empresa por causa do consumo de álcool, são assistidos de forma a solução do problema. Cabendo ao assistente social o encaminhamento do dependente ao tratamento, e também forma de prevenção do problema como exemplo a realização de palestras e debates (PINHEIRO, 2004).
A motivação do assistente social quando trabalha com o dependente seja de álcool, seja de outras substancia química, a sua reinserção e seu reajuste na sociedade. Não restringindo o seu trabalho apenas a orientação ao tratamento, mas também posterior a isso, como é ocaso do auxílio ao ex-dependente à procura de emprego, cursos e outras formas de inserção na comunidade que este participa.



CONSIDERAÇÕES FINAIS

A razão de popularidade que o álcool ganhou através dos tempos, deve-se aos novos padrões de consumo pós-moderno, que atribuem um valor “simbólico” às bebidas alcoólicas. Uma vez que existe uma interligação entre o prazer de beber pelos efeitos do álcool e ao prazer do consumo, também existe uma intenção de projetar nas bebidas um “status”, o que permite aos seus consumidores “estar na moda”, e a publicidade tem um papel fundamental na divulgação destes conceitos.
Porém apesar das suas conseqüências desastrosas, o ato de beber pode ser considerado também parte fundamental do convívio social, dificultando muito das vezes as campanhas de conscientização (muito aquém do necessário também). È no extremo do ato de beber, que encontramos aqueles que se tornam dependentes do álcool, que devem contar com o apoio e compreensão da sociedade para sua recuperação, que deve abandonar o preconceito e tratá-los com respeito.
Verificou-se neste trabalho que o alcoolismo não atinge apenas o alcoólico, mas, toda a família, relações de trabalho e a sociedade. A família sendo o grupo mais próximo, é a primeira a sofrer os impactos da doença em todos os sentidos. Porém os danos causados pela doença são muito sérios quando analisados em sua totalidade, e as conseqüências são constatadas pelo alto índice de violência e criminalidade, advindas do estado de embriagues provado pelo alcoolismo.
Assim, o alcoolismo deve ser visto de maneira diferenciada, não apenas como uma patologia psicológica, mas sim, dentro de um contexto social, pois é uma doença que tem repercussões sociais fortes. Sendo, o Assistente Social um profissional capacitado para lidar com as demandas sociais, abrangendo tanto questões ligadas à própria sobrevivência, quantas questões voltadas a valores e comportamentos. O Assistente Social enquanto um mediador estabelece uma relação entre a sociedade e os alcoólicos, que foi rompida devido ao problema do alcoolismo, que acaba deixando à margem da sociedade esse indivíduo, atuando sempre para promover a sua reintegração.
Além desta mediação, o assistente social deve buscar transformar seu cotidiano em uma pratica investigativa, propondo mudanças que busquem a avaliação das políticas sociais, desenvolvendo estratégias que contemplem a elaboração de projetos e programas de diagnóstico, prevenção e tratamento do alcoolismo. 
            Dentro dessa lógica se faz necessário uma formação continuada desse profissional para atender, cada vez mais, e melhor a população que sofre com esse mal da sociedade moderna, que expressado pelos números destacados no presente estudo, demonstra um problema que está longe de ter seu fim.


REFERÊNCIAS

1.      ALCOÓLICOS ANÔNIMOS. São Paulo: Símbolos S.A. Indústrias Gráficas, 2005.

2.      BÍBLIA SAGRADA. São Paulo: Paulus, 1985.

3.      BRASIL (1990). Ministério da Saúde. Programa Nacional de Controle dos Problemas Relacionados com o Consumo de Álcool - PRONAL. Brasília: MS/Disan, 1990.

4.    BRASIL (2010). Glossário de álcool e drogas / Tradução e notas: J. M. Bertolote. Brasília: Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, 2010.

5.      BUCHER, R. Drogas e drogadição no Brasil. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.

6.      CARDIN, M. S. et. AL. (1986). Epidemiologia descritiva do alcoolismo em grupos populacionais do Brasil. Cadernos de Saúde Pública, 2:191-211.

7.      CASTRO, N. S (2009). Intervenção do Serviço Social junto à Família de alcoolista.Disponível:<http://www.nead.unama.br/site/bibdigital/ monografias/alcoolista.pdf.>. Acesso em 02 out. 2012.

8.      CERVESATO, A. C. Z. (1993). Alcoolismo: como conhecer e tratar. Jornal dos Psicólogos da Saúde em Pernambuco, Recife. Ano I, n° 2.

9.      COLLINS, Gary R. Aconselhamento Cristão. São Paulo: Edições vida Nova, 1992.

10.  FÉLIX, M. S (2009). Alcoolismo & Serviço Social: Um trabalho concomitante. Disponível em: <http://www.cpihts.com>. Acesso em: 02 set. 2012.

11.  FORTES, J. R. de A. Alcoolismo. São Paulo: Savier, 1975.

12.  HOFF, Paul. O Pastor como Conselheiro. São Paulo: Vida 1996.
13.  JEROME, H.J. (1993). O conceito de dependência: Reflexões Histórico. Saúde Álcool e Mundial Research. 17. 188-190.

14.  KALOUSTIAN, S. M. (org). Família Brasileira a Base de Tudo. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2004.

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[1] De acordo com Bucher (1998), se entende por substâncias psicoativas como sendo produtos químicos, de origem natural ou de laboratório, que produzem efeitos sentidos como prazerosos, sobre o Sistema Nervoso Central. Estes resultam em alterações na mente, no corpo e na conduta.